E rola a bola… Texto de Mãe Stella de Oxossi

E rola a bola… Texto de Mãe Stella de Oxossi

De meia, de gude, de “baba”, de Copa do Mundo. No dia 30 de julho assistimos ao sorteio que definiu as competições preliminares da Copa. O sol, que como disse o jornalista Pedro Bial, trabalha sem descansar em nosso país, brilhará ainda mais para iluminar as cabeças responsáveis pelo planejamento desse importante evento mundial. Entusiasmo nós temos de sobra e ele é importante para a realização de qualquer coisa. Entretanto, entusiasmo sem planejamento e sem ética não é suficiente para produzir um resultado que tenha o brilho do astro rei, que nosso alegre povo tanto cultua. Muito bom seria se a Bahia sediasse a abertura da Copa de 2014. Afinal, como eu já disse, um chute que sai da África para cair no Brasil, só poderia cair primeiro na Bahia – estado que melhor define a riqueza cultural de nosso país, advinda de sua pluralidade racial.

Somos competitivos por natureza. Estamos em permanente disputa, por diferentes motivos (uns bastantes nobres, outros não). Na vida, assim como no jogo de futebol, disputamos para sermos vencedores, sendo a sobrevivência a maior de todas as vitórias. Os jogos competitivos são manifestações de um instinto natural e necessário, que abriga outro – a agressividade – também essencial, mas extremamente perigoso. A bola é a mais simples e uma das mais importantes invenções do homem por permitir que essas duas tendências da natureza humana possam ser reveladas, trabalhadas e controladas. Somos senhores e não escravos de nossa natureza animal. Temos o poder do sentimento e do raciocínio. Devemos ser vencedores, mas não devemos querer ser sempre vencedores. Até mesmo porque, em uma competição, alguém tem que perder para que o outro vença. Já que somos seres racionais, é injustificável que agressões individuais e coletivas ocorram nos estádios. Educação, fiscalização e punição são indispensáveis recursos para a preservação da paz, mas que de nada adiantarão se o indivíduo não trabalhar o autocontrole e aprender a se tornar responsável pelos seus atos.

A humanidade naturalmente encontrou, mas está tendo dificuldade de segurar, formas saudáveis de purgar – purificar e polir – o instinto agressivo. Tradicionais brincadeiras infantis, que eram usadas no dia-a-dia com essa intenção, não são mais vistas no nosso cotidiano. Quem não ouviu ou disse “foi para a feira perdeu a cadeira?”… Muitas dessas interessantes frases rimadas foram repetidas por gerações e gerações, a fim de provocar risos em uma situação que poderia surgir comportamentos agressivos. Quando chegávamos a casa com fome e reclamávamos: “Mãe… Minha comida! já é meio-dia!”. Ao que, ironicamente, ela respondia: “É?… Meio-dia, panela no fogo, barriga fazia. Macaco torrado, que vem da Bahia”. Era uma risada geral. Os hábitos mudaram e com eles o trato social. Hoje é capaz de uma criança chegar a casa e dizer: “Cadê minha comida, pô?”. Ao que a mãe irritada e estressada, responderá: “Se quiser, espere!”. Não podemos deixar perder o que a tradição nos legou, pois são fundamentos de absoluta importância para uma boa interação social. Essas frases irônicas são chamadas de parlendas: brincadeiras feitas em momentos especiais, com o intuito de que o instinto agressivo seja usado com moderação, de maneira que não cause danos físicos nem emocionais aos outros. O cabelo recém cortado merece uma tapinha na nuca, acompanhado da frase: “cortou o cabelo, não me avisou”; para um sapato novo nada melhor do que uma suave pisadela e a frase: “tirei o selo”. A importância da sabedoria popular é tão grande que existe um mês inteiro dedicado a ele – agosto.

Começamos este artigo falando de bola de gude, bola de meia…, enfim, de brincadeiras folclóricas. Passamos a falar de Copa do Mundo, uma competição institucionalizada, que tem seu fundamento em um jogo popular. E terminamos desejando ao Secretário Estadual Responsável pela copa 2014 – e toda sua equipe – muita tranqüilidade, inspiração, força e equilíbrio para realizar esse acontecimento com brilhantismo, fazendo com que sintamos que todos nós somos vencedores.

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