PREVISÕES DO ANO NOVO: Texto Pai Marcio de Jagum

PREVISÕES DO ANO NOVO:

De acordo com o complexo Cultural e Religioso Yorùbá, cada pessoa escolhe sua própria cabeça (orí), bem como seu destino (odù), antes de nascer.

Além disso, acredita-se que descendemos de nosso Òrìṣà, por isso o Candomblé é considerado uma Religião de culto ancestral.

Portanto, temos que nossa cabeça e nosso destino, são frutos do livre arbítrio e a regência do nosso Òrìṣà resulta da ascendência de cada um.

Assim, podemos concluir, de pronto, que um Òrìṣà que seja regente de um ano inteiro para todas as pessoas e um destino específico que se imponha para todo o mundo, soam como uma grande contradição aos princípios Yorùbàs.

Contudo, filosoficamente, podemos admitir que no campo das escolhas anteriores ao nascimento, esteja incluída a comunidade na qual aquele indivíduo irá nascer e desenvolver sua jornada.

E considerando a forte ligação cultural, espiritual e social que as comunidades yorùbás possuíam, há que se compreender que cada ẹgbẹ́ (comunidade) tivesse preocupações com a colheita, com as guerras, com as chuvas e demais fatores de âmbito coletivo que pudessem influir nas harmonia e na prosperidade daquele grupo.

Por isso, o olúwo, o olhador daquela comunidade, fazia no 6º dia do novo ano (ou em situações de grave crise e emergência), uma consulta ao Àgbikuà Ifá, um Oráculo específico através do qual respondem os 16 principais Odù de uma única vez. Assim, o Olhador encontraria o Odù que influenciaria aquela comunidade durante o ano novo.

Não era uma especulação fútil, uma curiosidade irresponsável, nem muito menos oportunidade de exibicionismo do sacerdote. Mas uma forma de prevenir o bem comum daquele grupo social. Nota-se aqui uma clara distinção entre odù pessoal e odù coletivo.

Por odù pessoal, pode se entender o destino escolhido subjetivamente e que será trilhado pelo Homem conforme a condução de seu próprio Orí. Já o odù coletivo, pode ser compreendido como influência, tendência, possibilidade, ou como destino de um povo, resultante das decisões coletivas.

No transpassar da Cultura Yorùbá para o Brasil, criou-se o Candomblé e este solidificou-se com a constituição de Terreiros tradicionais que reproduziram, reeditaram e adaptaram os costumes e práticas africanas à nova realidade.

Neste aspecto, cada Terreiro “matriz”, ou cada “raiz” da qual originaram diversas Casas abertas por descendentes daquele Àṣe principal, passaram a aguardar que as matriarcas e patriarcas fizessem a consulta ao Oráculo para saberem qual o odù que influenciaria nos interesses daquele grupo sócio religioso durante o ano novo.

Vale dizer que nesta consulta, é também considerado o Òrìṣà patrono daquela raiz e a influência que ele exercerá sobre seus adeptos e seguidores.

Com esse senso de preservação e união, muitos Terreiros tradicionais ao longo dos anos, conseguiram sobreviver a ataques, perseguições e dificuldades de toda ordem. Inclusive celebrando alianças políticas importantes e realizando rituais necessários para evitar e suplantar momentos difíceis.

Tudo isso, é bem diferente da curiosidade provocativa da mídia e da irresponsabilidade de certos sacerdotes que se lançam aos jornais, TVs e revistas profetizando o óbvio, movidos exclusivamente pela vaidade, sem qualquer noção do que dizem.

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Belém, 17/12/13

Márcio de Jagun

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