ARQUÉTIPO dos Orixas

ARQUÉTIPO:

 

A palavra “arquétipo” é originária do idioma grego e era designada para indicar as principais marcas, modelos, impressões que algo poderia apresentar.

Ao longo do tempo, este vocábulo foi aplicado na filosofia, para distinguir modelos de ideias; e também na psicologia, como uma forma de entender os padrões imateriais que os fenômenos psíquicos podem imprimir nas pessoas.

No estudo das religiões de Matrizes Africanas, a expressão “arquétipo” é utilizada para designar as características físicas e emocionais que as pessoas apresentam como herança, ou influência do seu Òrìṣà.

Gisèle Cossard assim discorreu sobre o tema: “Se se examinarem os iniciados, agrupando-os por Orixás, nota-se que eles possuem, geralmente, traços comuns, tanto no biótipo como em características psicológicas. Os corpos parecem trazer, mais ou menos profundamente, segundo os indivíduos, a marca das forças mentais e psicológicas que os anima.”

No Candomblé, partimos do pressuposto de que descendemos de nosso Òrìṣà. O Òrìṣà está em nosso DNA. Portanto, trazemos em nossa carga genética características desses ancestrais.

Nas palavras de Verger: “Em se tratando de escravizados no Novo Mundo, ou de seus descendentes aí nascidos, sejam eles de sangue africano ou mulatos, tão claros de pele quanto possível, não havia e não problemas, pois o sangue africano corre em suas veias, não importando a proporção, justifica a dependência do Orixpa ancestral.”

Adquirimos assim, traços de personalidade e aspectos físicos que nos identificam como descendentes dessas divindades. Por isso o Candomblé é considerado um Culto Lẹsẹ̀ Òrìṣà – um Culto Ancestral.

Obviamente o nosso Òrìṣà “de cabeça” não é o único a influir, afinal somos descendentes de muitos. Mas a maior carga hereditária decorre do Òrìṣà principal. Todavia, não podemos esquecer que também recebemos herança arquetípica dos Òrìṣà dos nossos pais biológicos. Isso explica os chamados Òrìṣà de “carrego”. Ou seja, aqueles que também fazem parte da nossa espiritualidade pessoal e que influem em gradação inferior ao chamado Òrìṣà “de cabeça” (divindade para qual somos iniciados).

Vejamos: se um pai biológico é descendente de Xangô (Xangô está no seu DNA) e uma mãe biológica é descendente de Oya (Oya está no seu DNA). Ambos têm um filho que poderá ser de qualquer Òrìṣà, mas Xangô e Oyá possivelmente irão compor o chamado “carrego” deste filho.

Este princípio se estende aos Òrìṣà dos nossos avós, bisavós paternos e maternos, ampliando bastante o leque formador do nosso ethos. Destarte, nosso DNA físico e espiritual recebe contribuições de muitas gerações em gradações diferentes. São como genes recessivos (cujas características não aparecem diretamente) ou dominantes (cujas características são visíveis). Mas, apareçam ou não, estão em nosso DNA e poderão ser transmitidos aos nosso filhos.

Os Òrìṣà de “carrego”, são aqueles que “carregamos”, “temos”, “possuímos”, “descendemos” e que são cultuados por nós nos rituais de Candomblé, sempre na proporção da influência que exercem em nós. O mais importante é o chamado “Pai de Cabeça”, seguido do “ajuntó” (2º Òrìṣà), posteriormente o 3º Òrìṣà (regente) e assim sucessivamente. Esses três primeiros, são os mais decisivos na formação do arquétipo pessoal.

Curiosamente, temos que os Òrìṣà de “carrego” não eram cultuados originariamente na África. Esta peculiaridade do ritual é exclusiva do Candomblé, que nunca é demais lembrar, é uma Religião de Matriz Africana, mas genuinamente brasileira, composta por características e peculiaridades próprias.

Possivelmente na África não existia rito aos Òrìṣà de “carrego”, porque lá, em cada Cidade, só seus próprios deuses eram cultuados. Deste modo, por exemplo, em Iré, só havia culto a Ògún. Em Ọ̀yọ́, só Ṣàngó era cultuado, em Òṣogbo, somente Ọ̀ṣùn recebia culto. Contudo, cada uma dessas divindades tinha certo enredo com outros deuses, os quais, em menor importância, também eram reverenciados.

É importante perceber que a composição dos chamados “pais de cabeça” (1º e 2º Òrìṣà) muda bastante as influências na pessoa. Bem assim determinadas qualidades de certos Òrìṣà, também alteram significativamente o arquétipo.

Uma pessoa que tenha Òṣàlá como primeiro Òrìṣà e Ọya como segundo, possivelmente apresentará um jeito de ser diferente daquele que seja também filho de Òṣàlá, mas tenha Yemọja e Oxum como segundo e terceiros Òrìṣà.

É indiscutível que as características de uma filha de Ọ̀ṣùn Ọ̀párà, são totalmente diferentes de uma filha de Ọ̀ṣùn Ẹyìn. As primeiras são mais agitadas, aguerridas, temperamentais. Enquanto as filhas de Ẹyìn são mais doces, pacientes e articuladas.

É claro que experiências vividas, influências sociais, a criação, bem como outros fatores também compõem nossa personalidade e nosso comportamento. Logo, não podem ser desprezados quando se fala de arquétipo.

É a experiência prática, a convivência, a repetição de certos padrões que torna o arquétipo perceptível aos olhos de quem convive, ou simplesmente conhece um omo orixá.

Detalhe interessante, é que o arquétipo não se revela unicamente naqueles que resolvem professar o Candomblé como religião. Por ser um conjunto de traços físicos e também de temperamento de cunho hereditário, o arquétipo revela-se nas pessoas de qualquer religião, a demonstrar que a opção pelo credo é subjetiva, mas a herança está no sangue.

O ìpọ̀rí – elemento do Orí que concentra a essência de cada Ser Humano registrando suas experiências, emoções e sabedoria ao longo das encarnações (àtúnwá), igualmente contribui na composição psíquica de cada um.

Portanto, “arquétipo” apresentado por alguém não pode ser considerado como uma verdade absoluta, nem muito menos deve ser utilizado como meio seguro para se identificar qual o Òrìṣà de uma pessoa.

O melhor, mais seguro e adequado meio para este fim no Candomblé, é a consulta ao Oráculo (Mẹ́rìnndílógún) por um sacerdote habilitado.

Arquétipo não é uma fôrma que torna a todos iguais. Nós cultuamos Òrìṣà e Òrìṣà é natureza. Por isso, por mais que duas florestas se pareçam, jamais serão iguais. Assim como os mares, os rios e as cachoeiras. As características principais ajudam a identificar, mas as peculiaridades locais é que dão o contorno final.

Márcio de Jagun

Babalorixá, professor e advogado.

Autor do livro “Orí – A Cabeça como Divindade”. Adquira direto com o autor: ori@ori.net.br

 

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Márcio de Jagun

 

A palavra “arquétipo” é originária do idioma grego e era designada para indicar as principais marcas, modelos, impressões que algo poderia apresentar.

Ao longo do tempo, este vocábulo foi aplicado na filosofia, para distinguir modelos de ideias; e também na psicologia, como uma forma de entender os padrões imateriais que os fenômenos psíquicos podem imprimir nas pessoas.

No estudo das religiões de Matrizes Africanas, a expressão “arquétipo” é utilizada para designar as características físicas e emocionais que as pessoas apresentam como herança, ou influência do seu Òrìṣà.

Gisèle Cossard assim discorreu sobre o tema: “Se se examinarem os iniciados, agrupando-os por Orixás, nota-se que eles possuem, geralmente, traços comuns, tanto no biótipo como em características psicológicas. Os corpos parecem trazer, mais ou menos profundamente, segundo os indivíduos, a marca das forças mentais e psicológicas que os anima.”

No Candomblé, partimos do pressuposto de que descendemos de nosso Òrìṣà. O Òrìṣà está em nosso DNA. Portanto, trazemos em nossa carga genética características desses ancestrais.

Nas palavras de Verger: “Em se tratando de escravizados no Novo Mundo, ou de seus descendentes aí nascidos, sejam eles de sangue africano ou mulatos, tão claros de pele quanto possível, não havia e não problemas, pois o sangue africano corre em suas veias, não importando a proporção, justifica a dependência do Orixpa ancestral.”

Adquirimos assim, traços de personalidade e aspectos físicos que nos identificam como descendentes dessas divindades. Por isso o Candomblé é considerado um Culto Lẹsẹ̀ Òrìṣà – um Culto Ancestral.

Obviamente o nosso Òrìṣà “de cabeça” não é o único a influir, afinal somos descendentes de muitos. Mas a maior carga hereditária decorre do Òrìṣà principal. Todavia, não podemos esquecer que também recebemos herança arquetípica dos Òrìṣà dos nossos pais biológicos. Isso explica os chamados Òrìṣà de “carrego”. Ou seja, aqueles que também fazem parte da nossa espiritualidade pessoal e que influem em gradação inferior ao chamado Òrìṣà “de cabeça” (divindade para qual somos iniciados).

Vejamos: se um pai biológico é descendente de Xangô (Xangô está no seu DNA) e uma mãe biológica é descendente de Oya (Oya está no seu DNA). Ambos têm um filho que poderá ser de qualquer Òrìṣà, mas Xangô e Oyá possivelmente irão compor o chamado “carrego” deste filho.

Este princípio se estende aos Òrìṣà dos nossos avós, bisavós paternos e maternos, ampliando bastante o leque formador do nosso ethos. Destarte, nosso DNA físico e espiritual recebe contribuições de muitas gerações em gradações diferentes. São como genes recessivos (cujas características não aparecem diretamente) ou dominantes (cujas características são visíveis). Mas, apareçam ou não, estão em nosso DNA e poderão ser transmitidos aos nosso filhos.

Os Òrìṣà de “carrego”, são aqueles que “carregamos”, “temos”, “possuímos”, “descendemos” e que são cultuados por nós nos rituais de Candomblé, sempre na proporção da influência que exercem em nós. O mais importante é o chamado “Pai de Cabeça”, seguido do “ajuntó” (2º Òrìṣà), posteriormente o 3º Òrìṣà (regente) e assim sucessivamente. Esses três primeiros, são os mais decisivos na formação do arquétipo pessoal.

Curiosamente, temos que os Òrìṣà de “carrego” não eram cultuados originariamente na África. Esta peculiaridade do ritual é exclusiva do Candomblé, que nunca é demais lembrar, é uma Religião de Matriz Africana, mas genuinamente brasileira, composta por características e peculiaridades próprias.

Possivelmente na África não existia rito aos Òrìṣà de “carrego”, porque lá, em cada Cidade, só seus próprios deuses eram cultuados. Deste modo, por exemplo, em Iré, só havia culto a Ògún. Em Ọ̀yọ́, só Ṣàngó era cultuado, em Òṣogbo, somente Ọ̀ṣùn recebia culto. Contudo, cada uma dessas divindades tinha certo enredo com outros deuses, os quais, em menor importância, também eram reverenciados.

É importante perceber que a composição dos chamados “pais de cabeça” (1º e 2º Òrìṣà) muda bastante as influências na pessoa. Bem assim determinadas qualidades de certos Òrìṣà, também alteram significativamente o arquétipo.

Uma pessoa que tenha Òṣàlá como primeiro Òrìṣà e Ọya como segundo, possivelmente apresentará um jeito de ser diferente daquele que seja também filho de Òṣàlá, mas tenha Yemọja e Oxum como segundo e terceiros Òrìṣà.

É indiscutível que as características de uma filha de Ọ̀ṣùn Ọ̀párà, são totalmente diferentes de uma filha de Ọ̀ṣùn Ẹyìn. As primeiras são mais agitadas, aguerridas, temperamentais. Enquanto as filhas de Ẹyìn são mais doces, pacientes e articuladas.

É claro que experiências vividas, influências sociais, a criação, bem como outros fatores também compõem nossa personalidade e nosso comportamento. Logo, não podem ser desprezados quando se fala de arquétipo.

É a experiência prática, a convivência, a repetição de certos padrões que torna o arquétipo perceptível aos olhos de quem convive, ou simplesmente conhece um omo orixá.

Detalhe interessante, é que o arquétipo não se revela unicamente naqueles que resolvem professar o Candomblé como religião. Por ser um conjunto de traços físicos e também de temperamento de cunho hereditário, o arquétipo revela-se nas pessoas de qualquer religião, a demonstrar que a opção pelo credo é subjetiva, mas a herança está no sangue.

O ìpọ̀rí – elemento do Orí que concentra a essência de cada Ser Humano registrando suas experiências, emoções e sabedoria ao longo das encarnações (àtúnwá), igualmente contribui na composição psíquica de cada um.

Portanto, “arquétipo” apresentado por alguém não pode ser considerado como uma verdade absoluta, nem muito menos deve ser utilizado como meio seguro para se identificar qual o Òrìṣà de uma pessoa.

O melhor, mais seguro e adequado meio para este fim no Candomblé, é a consulta ao Oráculo (Mẹ́rìnndílógún) por um sacerdote habilitado.

Arquétipo não é uma fôrma que torna a todos iguais. Nós cultuamos Òrìṣà e Òrìṣà é natureza. Por isso, por mais que duas florestas se pareçam, jamais serão iguais. Assim como os mares, os rios e as cachoeiras. As características principais ajudam a identificar, mas as peculiaridades locais é que dão o contorno final.

Márcio de Jagun

Babalorixá, professor e advogado.

Autor do livro “Orí – A Cabeça como Divindade”. Adquira direto com o autor: ori@ori.net.br

 

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