“Notícias nas Casas de Santo”. A fofoca que a cada dia fecha mais uma casa.

“Notícias nas Casas de Santo”

Vou te contar uma fofoca!!!… é assim que começa. E alguns ainda dizem: mas é uma fofoca do bem!! Como se pudesse de fato haver fofoca do bem.

Tenho observado que um grande número de pessoas que nos visitam relatam que tiveram “desentendimentos” com o zelador(a),  ou com a casa de santo ou com os irmãos e, por isso, abandonaram temporariamente a religião. Este motivo quase sempre tem um nome muito comum: fofoca.

Ela está sempre em voga, sempre se ouve falar nela e de todas as formas possíveis. E, por mais que tentemos isolá-la, ela insiste em resistir e em viver em pequenos grupos a interferir na conduta, no bem estar e na vida da comunidade. Ela afasta e desagrega, causa ou serve de pretexto para o afastamento das pessoas de uma casa de santo.

Fofoca é sinônimo de desunião, de discórdia e até de brigas sérias com tapas e ofensas. É também sinônimo de falta de ocupação e de cultura, porque onde há fofoca há falta de disciplina, de moral, de ética e de respeito. Ela está sempre à espreita, aguardando um ouvinte desavisado para despejar suas frustrações, desilusões, mágoas e outros sentimentos ruins.

Este texto “Notícias nas Casas de Santo” foi um pedido de minha mulher, Oyá L’afefé, que me alertou para essa praga que assola nosso cotidiano, roendo lentamente a estrutura da religião. Esta praga está destruindo carreiras que poderiam ser promissoras, mas que, por algum motivo, esbarraram neste mal e nestas pessoas que não sabem conter sua inveja e  quando diante de pessoas de intenso brilho, se sentem ofuscadas, pálidas, cinzentas. Mas estes,os fofoqueiros de plantão nunca se intimidam, não se recolhem a sua pequenêz e usam então do artifício da fofoca para denegrir, sujar, derrubar e afastar de nosso convívio estas luzes. Talvez só assim a sua luz pálida poderá ter alguma chance de ser notada, mas não de brilhar, no máximo uma pequena chama, que esperamos logo se apague em nosso meio.

O fofoqueiro me lembra uma frase engraçada. O fofoqueiro é como uma vaca em cima de uma árvore, ninguém sabe ou entende como ela chegou lá em cima. Mas todos tem certeza de em algum momento ela vai cair. O fofoqueiro tem um lema: destruir, afundar. “- Naufrago sim, mas levo pelo menos um junto comigo!”.

Fiquei pensando em colocar um manual básico de fofocas, para o principiante ter assunto nas rodas…, coisas assim “ingênuas”: “- Que roupa é aquela! Parecia uma alface!”, ou “- Fulano não sabe dançar!”, ou ainda “- Beltrano estava dando pinta!”… e já ouvi outras pois são bem variadas as fofocas básicas. Pensei, mas não vou falar disso porque também seria fofocar.

Mas porque agem assim estas pessoas? Será pura maldade então? Não creio nisso, muitas delas nem sabem que o que fazem é fofoca, acham que são notícias do Barracão. Sentem-se, portanto, uma espécie de repórter ou cronista ou até mesmo críticos de candomblé. Eles posam de sabedores e donos da verdade que só eles detêm, e donos do fundamento que só eles detêm. Daí, sentem-se no dever quase cívico de noticiar o fato, ainda que meio distorcido (por eles) ou tendencioso (a eles). Mas é o fato, aos seus olhos e ouvidos aquele é o fato e estão assim alheios ao bom senso. E vão então por aí criticando, noticiando… e se afundando.

Mas porque então muitos se deixam intimidar e influenciar por isso? Por que são bonzinhos e por que estão no grupo dos que têm grande luz e então são alvos de inveja e perseguição? Porque sendo altruístas e bondosos, preferem se retirar dos barracões e deixá-los aos que os caluniaram, aos que os decepcionaram?

Ora veja, se fosse assim tão fácil, quase a totalidade dos adeptos do Candomblé que já foram alvo das “crônicas”, ou de outros problemas de relacionamento se afastariam das casas de santo e não teríamos hoje mais ninguém que ao menos lesse nosso blog. Estaríamos num deserto religioso cercado de inúteis fofoqueiros por todos os lados.

Penso que as pessoas acima, as que se deixam influenciar, ainda não se deram conta de que, literalmente, escolhem suas famílias de santo, com seus defeitos e acertos, e são aceitos com suas ilusões de que todos são bons e que o mundo é cor de rosa.

É uma troca. E ambos os lados se tocam, se experimentam e se testam. Às vezes é um cabo de guerra, às vezes um afago, mas nunca ouvi falar que alguém foi obrigado a participar do culto; entra quem assim o desejar e da mesma forma é livre para sair, liberdade total. Por isso e, acima de tudo, é que essas pessoas deveriam se sentir no seio de uma família que o acolhe, mas não o obriga; que o orienta, mas não quer ser o único caminho, o correto, quer sim ser uma alternativa.

Quando comparo uma família de santo a uma família biológica, não vejo grande mudança estrutural. Ela é composta de um líder, irmãos, hierarquia, respeito e as coisas triviais do dia a dia. Mas em toda família tem aquele primo chato, eu tenho e você também tem; uma tia resmungona ou um outro parente qualquer com o qual não nos damos bem. Isso é quase uma regra e nem por isso “nos decepcionamos e os abandonamos” e nem à nossa família. Não é porque temos na família um chato e/ou fofoqueiro que deixamos de visitar a tia ou o primo… Visitamos, vamos às festinhas, rimos com as piadas chatas e ao final usamos a frase “os cães ladram e a caravana passa”, fazendo vista grossa ou ignorando os comentários sobre o vestido desalinhado, sobre a pouca comida na festa, sobre um outro primo chato que chegou com a namorada feia, enfim, aturamos tudo em benefício da família e do bom ambiente familiar.

Porque então não fazemos o mesmo em nossas casas de santo? “Os cães ladram e a caravana passa”. Porque se tem a idéia errada de que a casa de santo não nos pertence, que é propriedade do Zelador(a) e a ele(a) cabe saber e exterminar os focos da praga. Além do mais é mais fácil culpar uma “desilusão” do que admitir que o que buscávamos do candomblé, na verdade, era a magia, o glamour, o poder, a resolução fácil de todos os nossos problemas. E, como isso não é possível em todos os casos, procuramos o meio mais fácil para abandonarmos a casa, acusando alguém ou uma suposta desilusão ou decepção.

Não estou querendo tirar a culpa das costas de ninguém dizendo que essas desilusões não existem e não são incômodas, sei que elas realmente acontecem e que são de fato muito prejudiciais, mas o quero é dizer que nem sempre correspondem à verdade. E nós temos que lidar com a verdade, com a nossa verdade e com a verdade dos outros. Isso é complicaaaaaado!!!…..

Vejam o que diz a “pesquisa científica” que descobri sobre o percentual de chatos, incômodos e fofoqueiros que temos em cada casa de santo: eles são exatamente 0,0037% da comunidade. Isso em uma pesquisa séria, conduzida por um tal de Tomeje, com rigor e método. Talvez… rsrsrsr

Será que estes 0,0037% têm mais força que o restante da comunidade? Não creio.

O que nos falta para acabar com essa praga é saber o que de fato cada um deseja da religião. Assumir seus compromissos, ser de fato verdadeiro com o Orixá. Não pedir aquilo que no fundo sabe que não tem o direito de receber ou que não pode ser realizado. É se questionar sobre sua verdade diante da casa, deixando claro na comunidade qual é o seu compromisso com a continuidade da casa e da religião. Creio que é assim que se combate esta praga, pois aí não haverá muito espaço para os “repórteres plantonistas” te elegerem uma possível vítima.

Ter e participar de uma família religiosa é exatamente igual a ter e participar de uma família biológica. Exige esforço, determinação e muitas vezes um ouvido de mercador. Não é na primeira decepção que a abandonamos. Não sem lutar, sem resistir; e resistir neste assunto é não dar ouvidos à fofoca, não criar ou participar de grupinhos e panelinhas, é ser um membro atuante e um elo forte.

Já há muito tempo percebo que a fofoca se alimenta da curiosidade e nossa curiosidade deve ser alimentada com sabedoria e trabalho.

Axé à todos, Tomeje.

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