De grão em grão… Texto de Mãe Stella de Oxossi

De grão em grão…

O artigo anterior, intitulado “Sucateiro, sucateiro”, foi construído através de uma mistura entre realidade e fantasia. Para minha surpresa não foram poucos os e-mails que recebi tecendo comentários sobre o referido artigo. Uns falavam com saudosismo sobre os antigos vendedores que caminhavam pelas ruas exaltando suas mercadorias; outros diziam o quanto sorriram naquele dia ao lembrar o texto; já muitos outros comentavam sobre a relação entre sonhos e ilusões. Fiquei espantada com a surpresa que alguns leitores tiveram ao saber que eu ainda tinha sonhos. Transformei esse fato em um bom motivo para reflexão. Quando o corpo não nos dá condição de fazer uma boa faxina em uma casa, aproveita-se a cabeça para faxinar a alma e o espírito. Por que será que algumas pessoas puderam pensar que eu não tenho mais sonhos? – perguntei-me. Achavam eles que eu já tinha conquistado tudo o que eu queria? Pensavam que o mundo já estava tão chato para mim, tão repetitivo, que eu mais nada queria? Como não posso concluir o pensamento dos outros, não encontrei resposta para minhas indagações, mas espantei-me com a quantidade de sonhos (concretizáveis) que ainda guardo em meu interior. Uma das proibições que nós recebemos enquanto iniciados no Candomblé é ficar sentado com a mão segurando o queixo. O aprendizado embutido neste tabu é de que não devemos ficar apenas no mundo das ideias, devemos partir para a ação. Sendo assim, compartilharei com todos um dos muitos sonhos que ainda pretendo concretizar.

Todos os religiosos que sejam convictos de sua função na Terra, principalmente aqueles que são consagrados para o sacerdócio, têm consciência de que precisam fazer duas coisas aparentemente simples, mas que são complicadíssimas em seus fundamentos: dar e pedir. É a famosa Lei Universal da Troca que insisto em repetir em muito do que escrevo na esperança que fixe de vez em meu coração, e que penetre nos corações daqueles que ainda não atentaram em cumprir tão importante Lei. A religiosa baiana Irmã Dulce, foi um exemplo de cumprimento da lei em questão. Sua capacidade de doação é facilmente identificada através de suas obras, mas acredito que poucos conhecem o quanto ela precisou fazer uso da humildade para pedir o que necessitava, a fim de que seus sonhos se concretizassem. Quando crianças estudamos no mesmo colégio, assim pudemos acompanhar mesmo de longe a vida sacerdotal uma da outra. Eu sabia, por exemplo, que quando faltava algo que Irmã Dulce necessitava para ajudar aos menos favorecidos, ela simplesmente entrava em uma loja e pedia ao vendedor aquilo que precisava, carregava com suas próprias mãos e se despedia alegremente dizendo: “Deus lhe pague”.

Inspirando-me no exemplo que nos foi dado por Irmã Dulce, concluo este artigo revelando um de meus maiores sonhos que pretendo vê-lo concretizado estando eu ainda viva. Tenho a certeza que “sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só. Mas sonho que se sonha junto é realidade”. Por isso, busco em mim a humildade que me foi proporcionada pela vida religiosa para pedir, pedir muito, a ajuda de todos que preocupados com a violência que aumenta cada dia mais, e que vejam no estímulo à busca por uma maior espiritualidade, uma das saídas (mesmo sendo em longo prazo) para a diminuição de tanta agressividade. Revelo agora meu sonho acompanhado dos pedidos que faço para os amigos, e os amigos de meus amigos, no sentido de que eles usem a Web como uma grande rede de pescar benefícios coletivos: gostaria de construir uma biblioteca ambulante composta por livros voltados para o despertar da religiosidade inerente ao ser humano. Preciso de um ônibus que venha a ser adaptado. Peço a ajuda de pessoas físicas, empresas particulares, governamentais, enfim, peço ajuda aos homens e mulheres de boa vontade, que sabem que não basta apenas reclamar, nem apenas sonhar, tem que concretizar. Sendo assim, espero agora receber muitos e-mails com oferecimento de ajuda (não importando a forma nem o valor a ser oferecido), para que eu possa dizer, parafraseando Irmã Dulce: Que os orixás lhes paguem com bênçãos de todos os tipos.

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