Estado Laico.

Imaginemos que a maioria da população de um país pertença à organização religiosa Testemunhas de Jeová. Vamos supor também que eles consigam que os preceitos religiosos específicos dessa organização se tornem obrigatórios a todos, em forma de lei, já que são maioria. Isso significaria, entre outras coisas, que a transfusão de sangue seria proibida por lei. Agora imaginem que uma pessoa que não pertence a essa organização seja obrigada a seguir essa lei, e venha a morrer em consequência disso.

Este é um exemplo extremo, mas serve para ilustrar o absurdo de uma religião impor seus valores particulares. Por isso o Estado precisa ser laico. Se fala muito em Estado Laico, mas as pessoas em geral não sabem muito bem o que isso significa.  Em termos simples, significa que nenhuma religião pode se impor como diretriz à população como um todo através de leis.

Alguns países não são laicos, entre eles a maioria dos países da região árabe. Nestes países os preceitos religiosos devem ser seguidos por lei, deixar de cumprí-los resulta em punição, como se um crime tivesse  sido cometido.

Existem também países onde há uma religião oficial, mas ela não é imposta à população. O não cumprimento não implica em punição e há liberdade para seguir qualquer outra religião, ou nenhuma. Este é o caso dos países escandinavos, e o paradoxo é que ali o número de ateus é muito grande, 85% na Suécia e 60% na Finlândia. E mesmo os que participam da igreja, o fazem por tradição, não por serem especialmente religiosos.

O  Brasil é laico pela Constituição. Na prática, no entanto, não é o que realmente acontece. O divórcio só se tornou legal no Brasil em 1978; demorou por causa da pressão da Igreja Católica. Hoje temos o exemplo das bancadas evangélicas tentando impedir a aprovação da lei contra a homofobia, e eles se baseiam em suas crenças religiosas. Outro exemplo menos óbvio à primeira vista são os feriados, quase todos cristãos/católicos, e o pais (ou um estado, ou uma cidade) pára por causa deles.Algumas pessoas alegam que já que a maioria da população é cristã, é correto que a lei seja feita de acordo com a vontade dessa maioria.

Se assim fosse, não haveriam leis protegendo deficientes físicos, idosos, mulheres, crianças, etc. A verdade é que a democracia não pode se tornar uma “ditadura da maioria”. As minorias tem que ser respeitadas, desde que se mantenham dentro da lei, e a lei só pode determinar como ilegal aquilo que de fato prejudica alguém de forma concreta.

Algumas pessoas temem que um Estado Laico seja sinônimo de Estado Ateu, por pura desinformação. Nada mais longe da verdade. Além de garantir que uma religião específica não possa se impor, o Estado Laico também garante a liberdade religiosa em seu sentido mais amplo. Qualquer pessoa está livre para ter a religião que desejar, ou não ter nenhuma, como é o caso dos ateus. Isso significa que ninguém pode ser discriminado por causa de sua postura em termos de religião, que um católico ou evangélico não tem o direito de constranger um participante do candomblé, por exemplo.

A defesa do Estado Laico efetivo é uma bandeira do movimento ateu, e significa que muitas pessoas que sofrem perseguição por pertencerem a alguma religião minoritária também terão os seus direitos respeitados. Os ateus não pretendem de forma nenhuma que todos se tornem ateus, querem apenas ser respeitados em seu direito de não precisar esconder a sua não-crença. As religiões em si não nos incomodam, nos incomodam a arrogância de alguns religiosos ao se sentir no direito de nos discriminar. O cumprimento efetivo da Constituição na questão da laicidade é de fundamental importância para que todos, não só os ateus, tenham a sua liberdade de crença respeitada.

 

Escrito por Åsa Dahlström Heuser

 

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