Na matriz africana nao existe a figura do demônio

Na matriz africana, não existe a figura do demônio’, diz babalorixá sobre imagem de Belzebu exposta em fachada de casa no RS
Márcio de Jagun diz que exposição de imagem não ajuda a diminuir preconceito contra religiões de matriz africana.

Por Alan Souza*

24/03/2023 15h39 Atualizado há 17 horas

Michelly da Cigana em frente à estátua de Belzebu, o MaioralMichelly da Cigana em frente à estátua de Belzebu, o Maioral Arquivo pessoal
A discussão sobre a exposição da imagem de Belzebu na fachada de uma casa em Alvorada (RS) expôs uma racha nas religiões de matriz africana.

A proprietária da estátua Michelly da Cigana acredita que sua ação “desmistifica a religião”, a quimbanda.

O babalorixá Márcio de Jagun, doutor em filosofia africana, por sua vez, entende que essa não é a melhor forma de combater o preconceito contra religiões de matriz africana.

Márcio de Jagun é fundador do Instituto Orí, especializado em estudos sobre cultura e religiosidade afro-brasileira.

Ele explica que, apesar de a diversidade religiosa e a laicidade serem garantidas pela Constituição Federal de 1988, há uma discussão que precisa ser feita “do ponto de vista do conhecimento teológico”.

— A umbanda, candomblé e religiões de matriz africana passam por intolerância, uma demonização descabida. A melhor forma de se desmistificar ou “desdemonizar” essas religiões é buscando a matriz teológica: dizer que são crenças que não têm relação direta com o demônio.

No panteão de divindades de matriz africana não existe essa figura e nem mesmo Exu ocupa esse lugar de opositor ao criador.

A imagem que Michelly expõe é referida, muitas vezes, como diabo pela tradição judaico-cristã. De acordo com o babalorixá, no entanto, o “antagonista” ou alguma “personificação do mal” não existe nas religiões de matriz africana.

— Nas religiões de matriz africana não existe a figura do demônio. O satanismo e o luciferianismo, sim, são vertentes religiosas que cultuam essa figura.

A discussão começou com uma postagem de Ivan Almeida em sua conta no Twitter. “Vizinho novo chegou causando no bairro”, brincou ele. A postagem viralizou e, hoje, conta com mais de 90 mil curtidas na rede social.

Segundo a religiosa, apesar de as “divindades não entenderem de internet”, o vídeo de Ivan foi obra do plano espiritual para criar uma “oportunidade de esclarecer quem é essa divindade”.

— Eu estou gostando da oportunidade de desmistificar a minha religião. Essa divindade mudou minha vida financeira, protege minha casa, minha família — explicou. — Alguma voz pra dizer que (a quimbanda) não é uma religião das trevas.

Apesar de ser referida como uma vizinha nova, Michelly da Cigana afirma que mora no bairro há bastante tempo. Mas resolveu colocar a imagem de Belzebu na fachada somente em novembro do ano passado. Ela explica que a estátua é uma representação de sua fé.

— Coloquei a imagem no muro como uma espécie de adoração a Belzebu, o Maioral, uma divindade que cultuo há nove anos, para dizer que não tenho vergonha da minha fé.

*Estagiário sob a supervisão de Carla Rocha

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