O POVO DE RUA

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O POVO DE RUA

Denise Zenicola

III – E agora, José?

Com o tempo as  liteiras e carros de bois entraram em desuso; o trânsito aumentou trazendo pouco a pouco mais movimento.  A cidade tornou-se um cenário diferente, mais frenético e com barulhos diferentes.

Passaram-se os anos e o Rio “a maior concentração urbana de escravos existentes no mundo desde o final do Império Romano”(ALENCASTRO, 1997, 24)  mudou muitas vezes, no entanto, uma maioria negra ladeada de alguns brancos continua a carregar outras tinas, agora mais caixas de isopor e plástico, os quilombos persistem na favelas, as ruas continuam abrigando novos perigos.

Com quem compartilhamos hoje as praças, seus becos e ruas? Hoje, escravos modernos, ambulantes, camelôs, crianças, famílias inteiras de rua, loucos transitam por estes espaços. Como são as Performances do Cotidiano Urbano do Rio,  de circulação de informações, de lazer, de ordem e desordem? Como são esses momentos de transgressões espetaculares?

Segundo Baptista, na cultura atual de condomínios, “o ‘povo da rua’, personagem ‘diabólico’ da cultura popular que vive nas encruzilhadas, não tem vez neste projeto arquitetônico asséptico e sem transversais. São espaços que estilhaçam uma ética que se diz universal, mas que necessita da proteção da polícia e das grades dos condomínios fechados para o bom funcionamento” (1999, 38).

As performances foram se adaptando aos novos mundos sociais que por sua vez foram sendo definidos por  novas convenções, crenças religiosas e políticas, e estabeleceram novo caráter na ocupação destes espaços.

Os negros, ainda têm uma “subsistência” mínima  garantida nas ruas e praias do Rio de Janeiro, continuam servindo “uma burguesia que se deseja ser  segura e feliz” (BAPTISTA, 1999, 88).

Ao fazer uma entrevista com um casal de negros numa praia do Rio, um homem e uma mulher que fazem parte da história das ruas  do Rio de Janeiro,  o rapaz, um jornalista e sua companheira uma bela moça formada em Estética,  com muito orgulho mostraram colares, pulseiras brincos , os balagandans de outrora, fruto de uma pesquisa que eles vêem desenvolvendo  sobre a história das missangas e sementes e o caminho que estes materiais correram desde a África, mais especificamente do povo Massai, até chegar ao Brasil.

Ao final da entrevista falando sobre a perseguição que a polícia faz com freqüência aos ambulantes, o casal Carlos e Nishpara declarou : “Em tempo de paz qualquer pessoa tem o direito de ir e vir com os seus bens…”ART. 5, PARÁG. 9 da Constituição Brasileira, este é um exemplo do atual povo de rua, dois  trabalhadores e legítimos co-autores da história de um país chamado Brasil.

POVO DE RUA

 

Bibliografia:  

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Fontes Outras:

Entrevista, 25/10/2001- Carlos e Nishpara, praia do Rio de Janeiro, ambulantes de materiais de adorno em missangas.

CARLOS E NISHPARA – artesanatos em missanga – bhajanbr@yahoo.com.br

 

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