O SACRIFÍCIO ANIMAL

O SACRIFÍCIO ANIMAL:

“Com efeito, quase todas as coisas, segundo a Lei, se purificam com sangue  e sem derramamento de sangue não há remissão.”

(Hebreus 9:22)

Certamente este tema é provocador da maior polêmica em torno do Candomblé e seus Ritos.

Contudo, é bom destacar que o sacrifício animal não é invenção dos nativos africanos, nem tampouco os Cultos de Matriz Africana foram os únicos a utilizar esta pratica na sua liturgia.

Na Grécia antiga,  os fiéis eram consagrados a determinadas divindades com as quais tinham maior relação e frequantavam seus respectivos templos, onde se reuniam em torno do “bomos” (um bloco quadrangular de pedra), no qual os animais eram sacrificados.

Eram abatidos animais domésticos, principalmente bois e carneiros. A cabeça era separada do corpo com a machaira (uma espada curta) e colocada no cesto ritual (o kanun). O sangue vertido, era também separado e finalmente o animal tinha suas partes cortadas. As gorduras e os ossos de maior porte, eram separados da carne para serem cremados no altar.

As visceras (splanchna) eram grelhadas em espetos pelos executantes e depois distribuídas entre os pesentes, estabelecendo a comunhão entre os deuses e os adeptos.

A carne também era preparada e consumida em partes iguais pelos participantes no mesmo local, durante a festa de celebração.

Somente a língua e a pele dos animais sacrificados, ficavam separadas com o sacerdote que efetivara o ritual.

Vale dizer que na sociedade grega, só era consumida a carne dos sacrifícios.

Hermes, filho de Zeues e Maia, era o deus grego da fertilidade, da comunicação, dos caminhos, mensageiro dos deuses, patrono dos comerciantes e da eloquência. Suas oferendas incluíam incenso, mel, bolos, porcos e principalmente carneiros. O grande Zeus preferia bodes, touros e cabras.

As homenagens a Hermes (as hermas), eram colocadas em locais de passagem, como esquinas e portas.

As hermas consistiam em pequenas estátuas do busto de Hermes e de um falo semi-ereto.

Era comum que os exércitos levassem cabras em suas viagens, para sacrificá-las antes das batalhas em busca do apoio dos deuses para a vitória.

Outro hábito dos gregos, era derramar um pouco de vinho no chão antes de beber, oferecendo aos deuses. Este ato era conhecido como “libação”.

Também o Judaísmo pratica o sacrifício (korban). Sua base teológica é resumida pelo vocábulo hebreu “karov”, que quer dizer “vir para perto de Deus”.

É clássica a passagem do Velho Testamento (Gen., cap. 22)),em que Moisésé testado por Deus e leva Isac,  seu próprio filho, para ser sacrificado. Mas na última hora, Deus revela que queria apenas provar sua fé. Neste momento, libera Moisés de matar o filho, mas o profeta sacrifica então um cordeiro em seu lugar.

Segundo os exegeteas da Bíblia hebraica, os sacrifícios serviam a dois propósitos: selar uma aliança entre Deus e o povo de Israel, e para que Deus perdoasse os pecados (o animal morto estaria sendo punido no lugar do pecador).

Os árabes também realizam o sacrifício litúrgico de animais (udhiyah).

Os muçulmanos se baseiam no Corão (22:37) para agradar Alá com o sacrifício de cordeiros, ovelhas, cabras, vacas e camelos.

A matança pretende, além de servir como oferenda a Alá, ajudar os pobres e para reviver a experiência do Profeta Abraão (o mesmo citado acima).

O ritual do abate animal em sacrifício litúrgico no Islã, é denominado pelos muçulmanos como  Dhabĥ. A garganta e as veias jugulares são cortadas rapidamente com faca bem amolada. A espinha dorsal e o pescoço não podem ser quebrados até que o animal pare de se mecher, evitando dor. Este e o único procedimento ritual de sacrifício, sendo rejeitado qualquer outro método.

A carne resultante da matança, é então distribuída entre os parentes necessitados. Contudo, conforme o propósito ou da situação, pode ser consumida pela pessoa que sacrificou o animal. Qualquer animal deve ser sacrificado conforme o método acima, independentemente se a carne será utilizada em comemoração religiosa ou para consumo pessoal. Nessas condições, é então considerada “halal”, e própria para consumo.

No Candomblé os rituais de sacrifício são basteante rígidos e repletos de critérios. Primeiramente, acredita-se que os animais sacrificados já nasceram com este propósito. Razão pela qual, como integrantes da natureza, devem ser respeitados e jamais maltratados.

Os sacrifícios são precedidos de rezas que louvam aquele animal e pedem licença para que sejam abatidos.

Durante o ato, novas rezas são entoadas para que o sangue vertido converta-se em laços entre os seres e os deuses.

Para a Cultura yorubá, o sangue (èjè) é o elemento mais importante no ritual do sacrifício. É o condutor do axé (àse = fluido mágico invisível e essencial, presente em todos os elementos, condutor da vida e da energia).

Ele deve ser vertido primeiramente no chão, saudando Onilè (a divindade dona da terra) e posteriormente derramado sobre os símbolos e insígnias dos Orixás (ìdí òrìsà).

O sangue é o principal elemento da vida, e como tal é o elemento sagrado que faz a ligação entre o material e o espiritual. O sangue anima o corpo e dá à matéria a capacidade de ser animada pelo espírito.

Após a morte, são separadas as partes vitais concentradoras de axé, como o coração (okàn), pulmão (fúkù-fúkù), fígado (èdò), rins (iwe inú), a cabeça (orí), as patas e os órgãos genitais.

As demais partes do animal também são aproveitadas, até mesmo as penas. Nada é desperdiçado. A carne é consumida pela Comunidade (caracterizando a comunhão entre os homens e estes e seus Deuses), e o couro utilizado nos instrumentos de percussão (atabaques).

Somente pessoas qualificadas e preparadas podem realizar o sacrifício. Existe um cargo específico (asógún) para aqueles que abatem os animais em oferenda aos Orixás.

O animal não deve sofrer. Todos os cuidados devem ser adotados neste sentido. Somente pode ser concretizado o sacrifício, se o animal resolver comer as folhas sagradas que lhe são oferecidas pelo oficiante. Caso contraário, entende-se que os Orixás não aceitam o sacrifício daquele ser.

Cada Orixá tem seus animais preferidos para o sacrifício. Em geral, são utilizados cabras e cabritos (eran elésèmérin), carneiros (agutan), cágado (ajapá), frangos (adíe), galos, galinhas d´angola (etú), caramujo (èrò, ou igbi), pombos (eiyelé). Cada qual com uma finalidade e um simbolismo litúrgico.

Os aimais de sacrifício são escolhidos pelos Orixás conforme sua relação e finalidade: o cágado (preferido por Xangô, o deus que ama a vida), por sua longevidade; o pombo (preferido por Oxalá, o deus da ética e da moral), por representar a honra e a serenidade; o caramujo (também apreciado por Oxalá e outros Orixás, conforme a necessidade do seu sacrifício), por simbolizar a calma, a docilidade, a tranquilidade e a paz; a galinha (usada para agradar a todos os Orixás, sendo usados machos ou fêmeas conforme o sexo do deus ao qual será a oferenda), tem suas partes aproveitadas por diversas razões: as penas do peito (iye), que aquecem os pintinhos, servem para cobrir os assentamentos dos Orixás (ojubó) representando a proteção que se espera dos deuses; o bico, para levar aos deuses os pedidos feitos; as patas, para conduzir na direção correta dos Orixás as súplicas dos fiéis; as asas, para equilibrar a jornada; o rabo (para direcionar o caminho, como um leme).

Todos os Orixás recebem sacrifícios animais. Mas o primeiro a ser reverenciado é sempre Exu.

Há vários itans (parábolas dos Orixás) que explicam situações pelas quais Exu tem a prerrogativa de ser agradado primeiro. Separamos uma delas:

Exu era o filho mais novo de Orunmilá e de Yemanjá e irmão de Ogun e Oxossi.

Por ser caçula, era o último a comer.

Só comia as sobras dos animais caçados por Oxossi.

Só comia as sobras dos campos conquistados por Ogun.

Exu se revoltou e começou a comer tudo que via em sua frente.

A fome de Exu era incontrolável.

Certo dia, amanheceu e comeu todos os animais da vila em que vivia.

Outro dia, a tarde, comeu todos os cereais, frutas, inhames e pimentas.

Em outra data, a noite, resolveu beber todo o vinho de palma, a aguardente e o azeite de dendê que estavam sendo preparados.

A fome de Exu era sem fim. Nunca parava. Nunca diminuía. Quanto mais Exu comia, mais queria fome.

Depois de comer o que mais gostava, Exu começou a devorar as árvores, as flores, os pastos e os rios.

Todos da aldeia temiam ser também comidos por Exu.

O povo foi a Orunmilá, pai de Exu, pedindo sua intervenção.

O grande deus então ficou irado quando soube do caso, e percebeu que se não detivesse Exu, este comeria até mesmo o céu e acabaria com o reinado de Orunmilá

Orunmilá pediu a Ogun que fizesse o irmão parar a qualquer custo.

Ogun fez de tudo: conversou, pediu, brigou. Mas Exu não parava de devorar tudo a sua volta.

Ogun não teve outra alternativa a não ser matar o irmão Exu

Contudo, mesmo depois de morto Exu parou de comer. Exu continuou com fome!

Todos na vila podiam sentir a presença da fome de Exu.

Exu, depois de morto, engolia agora o axé e o emi (o hálito sagrado)

Ninguém mais tinha o que comer. Ninguém mais tinha energia nem forças para caçar, nem pescar, nem plantar.

O povo começou a adoecer e morrer de fome, um a um.

O babalawô da aldeia foi consultado e alertou a Oruminlá que Exu estava querendo chamar a atenção.

O babalawô recomendou a Orunmilá que Exu não poderia ser esquecido nem vida e nem na morte.

O babalawô disse que Exu queria ser reverenciado.

Orunmilá determinou a todos, então, que nunca mais comecem nada, sem antes alimentar primeiro a Exu.

Exu, o filho caçula, ganhou então a primazia na sua família, na sua vila e em todo o mundo.

A partir daquele dia em diante, nem homens, nem deuses, por ordem de Orunmilá, poderiam comer sem antes agradar primeiro a Exu.

O sacrifício animal é uma forma não apenas de sacralizar os elementos do culto, mas de reverter em vida a morte do animal através da transferência do axé existente no sangue, na energia e nas vísceras daquele ser.

Certamente o animal sacrificado no culto, foi mais respeitado do que aquel morto nos abatedouros comerciais.

Apesar da diferença dos métodos, dos animais abatidos e dos objetivos pretendidos com os sacrifícios, a verdade é que inúmeros povos, ao longo da História da Humanidade utilizaram a mesma forma de se unirem aos seus deuses. Porém, por força do preconceito contra o negro, sua Cultura e sua Fé, apenas os abates rituais no Candomblé foram e são duramente criticados pelos ignorantes.

No sacrifício litúrgico, nada há de bestial, atrasado ou ultrapassado. Antes pelo contrário. São expressões culturais e religiosas que devem ser respeitadas, se não comprendidas.

O sacrifício (rírú ebo òrìsà = oferecer sacrifício ao Orixá) é parte de um cerimonial religioso e se propõe a vários fins, como a ligação entre os fiéis e seus deuses (comunhão), homenagem, agradecimento, purgação de erros, apaziguamento, prevenção, substituição, tudo em prol do equilíbrio energético, através da troca de energia proposta pela própria natureza (cadeia alimentar). O sacrifício serve também para a sacralização de elementos do culto.

Numa sociedade como a nossa, na qual o governo oficialmente se beneficia com o sacrifício de animais, concede alvarás, recebe taxas e impostos e contabiliza receitas com o abate e o comércio de carne, criticar os ritos sacrificiais religiosos, seria no mínimo uma hipocrisia.

A garantia dos sacrifícios rituais e seu reconhecimento cultural e religioso, já foram consagrados pelos Tribunais brasileiros e internacionais.

Neste sentido, já se manifestou o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 70010129690 (Relator Desembargador Araken de Assis), julgado em 18/04/2005, na qual o Tribunal Pleno, por maioria de votos, proferiu o seguinte acórdão:

“…. É fato notório que o homem e a mulher matam, diariamente, número incalculável de outros animais para comê-los. O caráter exclusivamente “doméstico” do animal, ou seu uso para fins alimentares, depende da cultura do povo. Recordo a figura do cachorro, tanto animal de estimação, quanto fina iguaria em determinados Países. E não há, no direito brasileiro, norma que só autorize matar animal próprio para fins de alimentação.

Então, não vejo como presumir que a morte de um animal, a exemplo de um galo, num culto religioso seja uma “crueldade” diferente daquela praticada (e louvada pelas autoridades econômicas com grandiosa geração de moedas fortes para o bem do Brasil) pelos matadouros de aves.

Existindo algum excesso eventual, talvez se configure, nas peculiaridades do caso concreto, a já mencionada contravenção; porém, em tese nenhuma norma de ordem pública, ou outro direito fundamental, restringe a prática explicitada no texto controvertido.

Por outro lado, há precedentes respeitáveis no sentido de consagrar a liberdade de culto. É digna de registro a valiosa contribuição do Prof. Dr. HÉDIO SILVA JR., trazendo à baila o caso julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América, em outubro de 1992 (inteiro teor à fls. 296/428), no caso Church of Lukumi Balalu Aye versus City of Hialeah. Apesar de as leis locais proibirem, expressamente, o sacrifício de animais, prática adotada pela referida Igreja, pertencente à confissão da “Santería” (proveniente de negros cubanos), a Suprema Corte entendeu que as autoridades locais deviam respeitar a tolerância religiosa…Tanto assim é que, se me permite o eminente Relator, na ementa do seu douto projeto de acórdão, assim diz:

“Não é inconstitucional a lei que introduziu o parágrafo único, explicitando que não infringe o Código Estadual de Proteção aos Animais o sacrifício ritual em cultos e liturgias das religiões de matriz africana”…..Parece-me que, então, de uma vez por todas, ficaria claro que é permitido, mas não é uma permissão no sentido absoluto de que o animal possa ser sacrificado das formas, muitas vezes, mais cruéis/ e mais vis. Pelo contrário, respeitada essa linha, não me parece que haja no nosso ordenamento jurídico uma proibição quanto à morte de animais nesse sentido….” (grifo nosso)

Assim, o que verificamos é que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade acima mencionada concluiu não ser inconstitucional a lei do estado do Rio Grande do Sul que introduziu expressamente um parágrafo único, explicitando que não infringe o Código Estadual de Proteção aos Animais o sacrifício ritual em cultos e liturgias das religiões de matriz africana, sendo certo que naquele estado o direito à liberdade de culto religioso, incluindo a imolação de animais, foi resguardada de forma expressa, ressalvadas as disposições constantes do art. 32 da Lei Federal nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1.998 e do art. 64 do Decreto-lei nº 3.688, de 03 de outubro de 1.941 – Lei de Contravenções Penais, ambas estabelecem penas para a prática de maus-tratos e crueldade contra animais.

Nesse sentido, o que se verifica é que mesmo as religiões de matriz africana estão sujeitas à legislação federal de forma que se comprovada crueldade ou maus-tratos com animais poderá haver apuração em âmbito do processo penal, não estando elas isentas da observância dessa legislação, nem sendo vedada a imolação de animais em razão disso, porém, por certo, tais fatos demandam a necessidade de produção de provas na esfera penal, sendo que a simples presunção não é suficiente para restrição de um direito fundamental.

Ademais, cabe destacar, ainda, que a decisão proferida pelo referido Tribunal de Justiça foi recentemente reafirmada em sede de Ação Civil Pública nº 70026890210, julgada improcedente pela Segunda Câmara Cível do mesmo Tribunal, por unanimidade, em 12 de agosto de 2009, com o seguinte teor:

“…Estou votando por desprovê-lo – adianto desde logo –, mantendo a sentença hostilizada, que deu adequada solução ao caso ao concluir pela improcedência desta ação civil pública. “In casu”, vê-se que Promotoria de Justiça Especializada de Novo Hamburgo, após receber comunicação anônima, instaurou inquérito civil para apurar eventuais práticas abusivas contra animais e riscos à saúde pública em razão de sacrifícios (de animais) em rituais religiosos realizados em templo localizado na Rua Humaitá, nº 545, em Novo Hamburgo.Com base em parcos elementos de convicção amealhados no inquérito civil, propôs esta ação civil pública, cuja sentença desacolheu o pedido formulado à inicial ….. razão pela qual concluiu a sentença, de lavra do culto Juiz de Direito LUIZ FELIPE SEVERO DESSESSARDS, pela desestimação da demanda, em termos que adoto como razões de decidir e incorporo ao meu voto, transcrevendo-os no que releva, “in litteris” (fls. 199-199v.):

(…) sopesado o suporte legislativo e a declaração de constitucionalidade da LEI 12.131/04, concluo que para a formação de juízo de procedência na presente demanda, imperiosa seria a comprovação de que, nos cultos religiosos empregados pelo réu ocorrem, de fato: (I) a prática de recursos de crueldade na morte dos animais; (II) o uso de animais não destinados à alimentação humana; e, (III) a inadequada destinação dos despojos do animal, para fins de resguardo da saúde pública.

No entanto, não há nos autos, minimamente, provas no sentido de corroborar às alegações da inicial, nada obstante a ampla dilação probatória facultada.

Cediço, pois, que as alegações das partes devem ser comprovadas e, na esteira de que alegar e não comprovar é o mesmo que nada alegar – alegata et probata – não há como acolher a pretensão ministerial, tendo em vista os elementos concretos coligidos aos autos, (…).

Também o ofício emanado da Secretaria de Meio Ambiente (fl. 41) não é conclusivo no sentido de que havia prática de atos cruéis. O fato de haver animais mortos no local (uma pomba e um cabrito), não leva, por si só, o reconhecimento da existência de crueldade ou excessos.

Efetivamente, entender de outro modo importaria em negar ao réu o direito constitucionalmente garantido de liberdade de culto….”

Interessante observar quais foram os únicos  “senões” ao sacrifício destacados pelos Julgadores: a prática de atos de crueldade, o sacrifício de animais não utilizados para o consumo humano e a má utilização dos despojos do sacrifício causando prejuízo à saúde pública.

Negar o sacrifício ritual, seria além de ilegal, um ato de profundo constrangimento ao direito de crença e de culto, garantia de qualquer Religião.

Necessário destacar também os Tratados Internacionais que abordam o assunto:

Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos:

“art. 18, item 1. Toda pessoa terá direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Esse direito implicará a liberdade de ter ou adotar uma religião ou uma crença de sua escolha e a liberdade de
professar sua religião ou crença, individual ou coletivamente, tanto
pública como privadamente, por meio do culto, da celebração de ritos, de práticas e do ensino.”

“Item. 3. A liberdade de manifestar a própria religião ou crença estará sujeita apenas a limitações previstas em lei e que se façam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. (promulgado pelo Decreto nº 592, de 06 de julho de 1.992).

Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San Jose da Costa Rica:

“art. 12, item. 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de consciência e de religião.

Esse direito implica a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em público como em privado.”

“Item. 3. A liberdade de manifestar a própria religião e as próprias crenças está sujeita unicamente às limitações prescritas pela lei e que sejam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral pública ou os direitos ou liberdades das demais pessoas. (promulgada pelo Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1.992).”

Declaração para Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e de Discriminação baseada em Religião ou Crença:

“art. 6°. De acordo com o art. 1° da presente Declaração, e sujeito às disposições do § 3°, do mesmo art. 1°, o direito à liberdade de pensamento, consciência, religião ou crença deve incluir, inter alia, as seguintes liberdades: (a) Cultuar e reunir-se por motivos relacionados à religião ou crença, e estabelecer e manter locais para estas finalidades; (b) Estabelecer e manter apropriadas instituições de caridade ou humanitárias; (c) Fazer adquirir ou utilizar na medida adequada os artigos e materiais necessários relacionados aos ritos e costumes de religião ou crença; (d) Escrever, emitir ou disseminar publicações relevantes nestas áreas; (e) Ensinar uma religião ou crença em locais apropriados; (f) Solicitar e receber financiamentos voluntários e outras contribuições de indivíduos ou instituições; (g) Treinar, apontar, eleger ou designar por sucessão líderes apropriados de acordo com as exigências e padrões de cada religião ou crença; (h) Observar dias de descanso e celebrar festas e cerimônias de acordo com os preceitos de religião ou crença; (i) Estabelecer ou manter comunicações com indivíduos ou comunidades sobre o tema de religião ou crença a níveis nacional e internacional. (adotada pela Resolução 55 (XXXVI) (1981), 21.I.L.M.205 (1982) pela Assembleia Geral das Nações Unidas).

Declaração Universal dos Direitos Humanos:

“art. 18: Todo o homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observâcia, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.”

Apesar do Brasil ser um país laico, a Constituição Federal Brasileira assegura a liberdade religiosa em toda a amplitude de culto:

Constituição Federal do Brasil:

“artigo 5º, VI: é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.”

Totalmente contra todas essas correntes e bases legais, a Câmara Municipal de Piracicaba pretendeu a aprovação de uma lei proibindo o sacrifício animal naquela Cidade.

Contudo, o Prefeito Barjas Negri, atento e embasado, vetou o infeliz projeto de lei, nos seguintes termos:

“Desta forma, é por razões de inconstitucionalidade do projeto de lei ora vetado e, com base no disposto no § 1º, do art. 121, da Lei Orgânica do Município de Piracicaba, que apresentamos, tempestivamente, o presente VETO TOTAL ao Projeto de Lei nº 202/10 – Autógrafo nº 256/10, para apreciação dessa Nobre Casa de Leis, contando com o alto grau de discernimento dos Ilustres Vereadores, para que o mesmo seja acolhido por UNANIMIDADE! Piracicaba, em 01 de novembro de 2010.BARJAS NEGRI. Prefeito Municipal. ( Diário Oficial de PIRACICABA, sexta-feira, 05 de novembro de 2010, pp. 2 e 3)”.

Por fim, temos que o sacrifício animal é uma manifestação cultural e religiosa histórica, recorrente em diversas sociedades e em eras variadas.

Particularmente no Candomblé, o sacrifício segue uma tradição igualmente importante e indissociável em sua expressão ritual e litúrgica, que, a exemplo das outras Religiões, também é realizado com critério, respeito e espiritualidade. Tudo perfeitamente reconhecido pela lei brasileira e internacional.

Márcio de Jagun

Babalorixá, escritor, professor universitário, advogado e apresentador do Programa Ori (ori@ori.net.br)

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