Sacerdócio X motorista de ônibus

Durante alguns anos eu deixei de escrever aqui no blog. Não por falta de gosto, mas porque eu precisava me reciclar, me reencontrar, ter novas experiências. O sacerdócio me deu isso tudo. Minha jornada, ao lado do meu Pai Marcio de Jagun tem sido enriquecedora e muito proveitosa, por isso, resolvi escrever novamente.

É como meu Pai sempre diz: Sacerdócio de candomblé é como ser motorista de ônibus! Sim, é verdade. Nós temos a função de guiar, de conduzir da melhor maneira a família. Mas temos que ter sempre muito claro que nem todos seguirão conosco até o final da linha. Na verdade temos que ter uma fé muito grande para que nós mesmos, diante de tantos obstáculos, não desejemos para e saltar antes da hora. E, por este motivo, ser sacerdote é, eminentemente, uma questão de fé e de compromisso.

Como num ônibus, nós buscamos os melhores caminhos e em cada um deles entram pessoas de temperamentos diferentes, educação diferente, cultura diferente e desejos muito diferentes entre si.  Às vezes dá certa confusão, os passageiros/filhos se atritam, querem um lugar na janela assim que entram, não querem pagar a passagem ou acham que está caro. Isso é assim em todo lugar, há os querem seguir em frente e não se importam com “lugares marcados”, querem um lugar ao sol e isso lhes basta. Mas sempre há aqueles para quem o sol não lhes basta, o outro não lhe basta, a sua posição hierárquica não lhe basta e não estão nem um pouco preocupados se os mais velhos estão há mais tempo na Casa/ônibus, eles querem a sombra e água fresca, querem se esconder dos seus deveres. Não! Não com a sociedade religiosa, mas sim, dos seus Orixas.

Nestes casos, nada melhor que um bom “freio de arrumação”! para colocar as coisas em seus lugares.

As dificuldades da vida estão postas para todos. Para os que tem e para os que não tem dinheiro, para os que conhecem e para os que desconhecem as normas e etiquetas e, também, para aqueles que querem e para aqueles que não querem assumir seus lugares na sociedade chamada Egbé. A questão é saber quando e como isso vai acontecer na vida de cada filho. E isso, é, na minha opinião, função do sacerdote esclarecer a cada membro desta sociedade religiosa,  e não deve ser delegada a ninguém.

É um jogo delicado esta condução, não podemos ser duros demais, nem flexíveis demais, nem muito Pai, nem muito amigo. É um equilíbrio confuso, onde nem sempre o coração pode prevalecer. Algumas vezes é preciso que um ou outro passageiro/filho, salte antes do ponto dele para que o coletivo siga em paz. É doloroso, mas nem sempre será possível conciliar todos os interesses, e o que deve prevalecer é o conjunto harmônico. Portanto, ser capacitado e habilitado na sua função, seja motorista ou sacerdote, é fundamental.

Nós temos que ter nas mãos a direção com firmeza e deixar muito claro qual o percurso seguiremos, por quais caminhos vamos trilhar, os buracos e solavancos do caminho. Não se deve enganar ou omitir dos filhos as dificuldades e também não devemos poupá-los das tristezas. Afinal, ser sacerdote é muito mais que ficar noites em claro, é fazer escolhas, é guiar!

Vejo muita gente buscando o caminho “fácil” o milagre, o sonho, a felicidade, a sorte, o dinheiro e o amor. Mas vejo que estes se esquecem do fundamental. Esquecem de colocar nos seus pedidos a VERDADE INTERIOR. Axé e felicidades e que meu Pai Ogun lhes de um bom dia, todos os dias. Tomeje, 13/04/2016

Respostas de 3

  1. Partilho de suas opiniões, mais uma vez fico bastante orgulhoso em saber que nossa religião tem pessoas com o equilíbrio necessário a cuidar de cabeças de outras….. Isso alegra, ainda mais se levarmos em conta os modismos editados diariamente nos facebooks da vida, as contas de grau e ojás enormes usados por Iyawôs….. Nossa religião está a beira de virar um grande circo dos horrores e peço a Ayrá que dê sempre o devido discernimento a pessoas como vcs, para que ela não acaba de vez.

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