A MATA – IGBÓ: Texto de Pai Marcio de Jagum

A MATA – IGBÓ:

Partindo-se do pré suposto de que as divindades cultuadas no Candomblé são ancestrais que por seus méritos, características e regências foram assimilados e integrados aos 4 elementos da natureza, tem –se que esta Religião cultua a natureza por meio de seus Orixás.

Observa-se desta forma, como os ritos estreitam os laços e integram os adeptos às forças naturais que os cercam.

Basta dizer que um dos primeiros rituais propiciatórios à Iniciação, é levar os neófitos para apresenta-los aos Orixás da água doce (Òrìṣà omi odo), aos Orixás da água salgada (Òrìṣà omi iyọ), aos Orxás das Matas (Òrìṣà igbó), etc.

Neste particular, podemos notar que o uso ritual das plantas (elementos integrantes das matas) é absolutamente indispensável a quaisquer liturgias que envolvam a energia dos Orixás. Daí o provérbio yorubá: “Kosi ewé, kosí Òrìṣà” – sem ervas não há Orixá.

Assim, seja para o assentamento dos deuses (ìdí òrìṣà), seja para os banhos purificatórios, seja para os preparativos iniciatórios, seja para os sacrifícios, sempre o uso das ervas será notado.

Em razão disto, batizamos nossa obra sobre a ciência yorubá do uso das ervas, com o título “Ewé – a Chave do Portal”.

Portanto, torna-se crucial para o próprio funcionamento de uma Casa de Candomblé possuir acesso à mata (igbó), pois é lá que o Olossaim (sacerdote responsável pela colheita e preparo das ervas) irá buscar a matéria prima para a verdadeira alquimia que consiste em seu ofício.

Os Olossains, para ingressarem na mata na busca das ervas, começam seus preparativos de véspera. Desde 24 horas anteriores já não bebem, nem mantém relações sexuais e ainda evitam comidas pesadas. Tudo a fim de tornar mais limpo o canal intuitivo entre si e Ossaim, a divindade detentora de todas as plantas e seus segredos.

No início de sua jornada, assim que entram na mata, os Olossains cuidam logo de fazer uma oferenda a Ossaim, a fim de pedirem licença para acessar seus domínios, precaverem-se dos perigos e ainda garantirem que Ossaim não irá esconder deles as plantas desejadas.

Não obstante, no momento da colheita, verbalmente os Olossains pedem licença ao Deus das ervas para retirar os exemplares.

O dia, a lua e o horário da colheita são minuciosamente estudados pelos Olossains, conforme a necessidade das ervas a serem utilizadas.

É claro que a urbanização inviabilizou que as Casas de Candomblé possuam suas próprias matas, como no passado. A facilidade de outrora que popularizou o nome dos Candomblés de “Roças”, já não mais existe.

Por isso, muitas Casas adaptaram-se à nova realidade reservando espaço para suas hortas, onde são plantadas espécies indispensáveis ao culto, tais como o pèrègún (nativo), o igi `ọp`ẹ (dendezeiro), lárà (mamona), `ọdúndún (saião), entre outras.

Se no passado apenas as ervas colhidas diretamente no igbó (na mata) serviam para os rituais, hoje os Candomblés precisaram reconsiderar este princípio e passaram a aceitar as folhas cultivadas no herbário, quiçá aquelas compradas em bancas e lojas especializadas.

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Rio, 10/7/13

Márcio de Jagun

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