Religião Africana, Politeísta ou Monoteísta?

RELIGIÃO AFRICANA, POLITEÍSTA OU MONOTEÍSTA?

Artigo de Sango Biyi

Na semana passada, fui interpelado por um “amigo” que me perguntava o por quê, sendo eu um homem branco, estava envolvido com um sistema politeísta africano, como se nosso culto aos Orisa fosse algo involuído, arcaico, enfim pagão!

Respondi para ele que, primeiramente não enxergava questões de “negros e brancos”, mas sim questões que envolvem os SERES HUMANOS, que não são medidos ou avaliados pela questão da cor de suas peles, e sim, pelas suas obras e pensamentos; e, em sugundo lugar que ele estava redondamente enganado, ao afirmar que o culto aos Orisas é politeísta, pois o mesmo se baseia na idéia de um Deus Supremo, chamado por nós de Olodunmare, que através do desdobramento quântico de Si Mesmo, cria um Universo Manifesto, bem como os Orisas e Ebóras, dando a estes últimos a condição de arcanjos e auxiliadores da humanidade, organizados em um complexo sistema de classificação, que foge em muito as vãs tentativas de classificação diminutivas e racistas que tentam nos impor ainda hoje. Haja vista que diante das Leis de nosso País, cujo sangue de nossos antepassados serviu de irrigação durante séculos para que o mesmo crescesse, a nossa religião, ou seja, a religião original dos negros escravos ainda hoje, como no passado, é considerada crime, previsto em Código Penal Brasileiro. (Ex: se um dízimo fosse cobrado por um sacerdote de Orisa, seria visto de forma ilícita pela Lei, enquanto que de outras religiões não, como padres, pastores etc).

Já que nosso culto existe, seguramente há mais de 9000 anos, o que certamente nos garante uma certeza de que vários sistemas assim chamados monoteístas, foram influenciados por ele, ainda que ocultadamente, os mesmos preferem “ignorar o fato” de que tanto o Judaísmo, quanto o Cristianismo e o Islamismo, tiveram o seu nascimento no Continente Africano.

Diante do exposto acima, resolvi dissertar um pouco daquilo que sei sobre essa belíssima, e mais do que merecedora de todo o nosso respeito, a Religião do Culto aos Orisas, no tentativa, quem sabe, arrojar um pouco de luz, sobre este assunto tão sério e, ao mesmo tempo, tão desrespeitado por nosso povo e pelos órgãos governamentais em nosso País.

O conceito de Deus na religião yoruba – a cosmogenese

Para os Yorubas, Olodunmare concebe ao Universo em um êxtase de Si Mesmo. Assim, podemos dizer que a criação tem suas raízes no futuro, pelo qual ele vive. O mundo está suspenso em sua plenitude final, a qual lhe dá sentido e coesão. O mundo está inquieto porque é criado dinamizado, tenso na direção de um polo que quase todo ignoram na direção de um nascimento ao qual aspira até mesmo a criatura inanimada.

Criado assim, o mundo só pode existir em evolução. Sua perfeição se situa no fim e não aparece desde a origem. A Criação de realiza numa ascensão espiritual progressiva, desde a matéria dita inanimada, até atingir, no homem, a dignidade da consciência, a dignidade da pessoa, que está, como estamos vendo, muito além da questão da cor de sua pele, ou da condição de sua “raça”.

Existe, para a Yoruba, por detrás das aparências e do mundo visível, um elemento inteligente, “racional”, que regula, dirige, anima o cosmos, e que faz com que esse cosmos não seja caos, mas ordem. Há, com certeza na origem do Universo um impluso de pura consciência.

Como nos disse uma vez o Astrônomo J. Dean “… Não sabemos se Deus realmente existe. Mas o Universo funciona como se Ele existisse…”.

“… Na origem da Criação não há acontecimento aleatório, não há acaso. Há, isso sim, um grau de ordem infinitamente superior a tudo aquilo que podemos imaginar: ordem suprema que regula as constantes físicas, as condições iniciais, o comportamento dos átomos e a vida das estrelas.

Poderosa, livre, infinitamente existente, misteriosa, implícita, invisível, sensível. Ela está ali, eterna e necessária por trás dos fenômenos, acima do Universo, mas presente em cada partícula. (Rihas)”.

Na cosmogenese yoruba, o universo inteiro está como que cheio de inteligência de de intenção: desde a menor partícula elementar até as galáxias.

Só podemos nos aproximar de uma compreensão de Criação dentro do entendimento do mistério de uma essência trinitária em OLODUNMARE, tentando entender-lhes os movimentos e os processos deles decorrentes em consonância com a essência que nos é apresentada nas Revelações a respeito de ORUNMILA e ELA OMO OSIN.

OLODUNMARE

Itan Odu OYEKU-OGBE

“Eo mó Iya”

K’enyin o ma tun sure puró mó;

Eo mo Baba

K’enyin o ma tun sure s’eke mó;

Eo mó Iya, eo mó Baba

OLODUNMARE

Eyi l’o d’IFA fun Tela-iriko

T’o só wipe on nre ‘ki

OLODUNMARE…”

TRADUÇÃO

“Você não conhece a Mãe”.

Pare com sua impetuosa mentira;

Você não conhece o Pai

Pare com sua impetuosa mentira;

Você não conhece a Mãe, você não conhece o Pai de OLODUNMARE

Este foi o veredicto do oráculo de IFA para Tela-Iroko,

Aquele que propôs a origemdo nome de OLODUNMARE…”.

OLODUNMARE é um espírito infinitamente perfeito, que existe por si mesmo e de que todos os outros seres recebem a existência. OLODUNMARE é o Seu Ser, o Ser sem semelhança. Por isso quando o nomeamos apenas tangenciamos Sua essência.

O sentido mais profundo que encontramos ao analisar o nome de OLODUNMARE nos traz o significado de “Eu Sou Aquele que É”, o nome designando o próprio ser, o ser das coisas em sua manifestação e em sua relação e em sua relação com o Universo. A identidade entre OLODUNMARE e o Seu Nome só não é completa porque o nome designa-o em sua expansão para fora de si mesmo.

A revelação de nome é extremamente significativa da propensão de OLODUNMARE a sair para a Sua Criação. Nesse significado temos para o nome de OLODUNMARE um nome que é a “expressão de Seu Ser”.

Esse nome é único por que contém todo o mistério de OLODUNMARE; ele é pronunciado em eterna atualidade. É o nome da santidade transcendente, o que exprime também a presença dinâmica de OLODUNMARE em Sua Criação e a fidelidade de Sua assistência aos homens.

A existência de OLODUNMARE, mais que um pressuposto, é verdade fundamental, ponto de partida para qualquer discurso religioso.

É como se primeiro, reconhecêssemos a Sua existência, depois procurássemos a ponte capaz de nos levar a Ele, capaz de propiciar as religação com nossa origem. Afinal, nas extremidades invisíveis do nosso mundo, abaixo e acima da nossa realidade, paira o espírito.

Nossos espíritos humanos e o desse ser transcendente a quem chamamos OLODUNMARE são levados a se encontrar.

No entanto, é natural, para todos nós, a idéia de que não podemos compreender OLODUNMARE. Na medida em que Ele é infinito, princípio e fim de todas as coisas, encontra-se além dos limites humanos a Sua compreensão. Podemos, isso sim, conhecê-lo através de Seus atributos e deduzir a Sua existência através de Sua manifestações no Universo e nas coisas criadas.

Somo levados, também, ao conhecimento do OLODUNMARE pela “negativa” do que conhecemos, ou seja, sabemos com clareza e precisão o que OLODUNMARE não é. Assim, por exemplo, conhecemos a finito e a imperfeição.

Dizemos que OLODUNMARE é infinito e perfeito e são conseguimos pensar esse conceitos a partir da “negação” dos conceitos que conhecemos.

Para crermos na existência de OLODUNMARE e avançarmos em direção aos seu conhecimento não é necessário que comecemos por usar os caminhos da razão. Olhamos e vemos; o mundo é um espelho a mostrar permanentemente a Sua presença e grandiosidade.

Para se conhecer OLODUNMARE, a intuição vem antes; a procura, o raciocínio, seguem-se o vêm confirmar e preciso o que o olhar já começou a descobrir. Afinal de contes, “por que existe alguma coisa ao invés de nada?”

Diante do maravilhoso e fantástico espetáculo da Criação, a razão humana é capaz de caminhar até o conhecimento da existência do Criador. Em Seus reflexos espalhados pelo Universo, ela pode adivinhar Suas perfeições de poder, de beleza e de bondade, manifestos em cada ser e em cada elemento. Sua realidade objetiva, invisível mas manifesta Seu eterno poder e Sua divindade – torna-se compreensível, desde a crisção do mundo, através das criaturas.

É a partir desse processo do conhecer que, em nossa religião, afirmamos ser OLODUNMARE “o único no céu e na terra, o Supremo sobre todos nós” e O chamamos referindo-nos particularmente as Suas características de “Senhor de todas as coisas”, “o Soberano que está no Orun”, “Aquele que tem a máxima autoridade sobre tudo”.

OLODUNMARE pode ser conhecido por muitos nomes – afinal de contas, muitas são as Suas particulares manifestações nos diversos momentos e planos da Criação, e assim, muitas vezes, Ele é chamado do OLOFIN ou OLORUN.

Muitas vezes, querendo expressar uma emoção extrema ou apelo urgente, reunimos os três nomes de OLODUNMARE em uma mesma exclamação “L’oju OLODUNMARE! L’oju OLOFIN! L’oju OLORUN!”, significando “Na presença de OLODUNMARE! Na presença de OLOFIN! Na presença de OLORUN!”

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O CENTRO CULTURAL AFRICANO através de seus projetos e eventos procura mostrar a sociedade brasileira, a necessidade de uma consciência mais profunda e ampla da importância da raça negra no processo de formação histórica do Brasil.

 

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